Milionários americanos correm para confinamento de luxo por causa do Covid-19

Por Pablo Guímon, de Washington

“Estou pondo a família no carro. Em duas horas estarei na estrada. Tenho 200.000 dólares. Quero uma casa com seis ou sete quartos. E quero dormir nela esta noite.” Esse foi o conteúdo da mensagem recebida no começo de março por Eddie Shapiro, presidente da imobiliária NestSeekers, especializada em propriedades de luxo nos Hamptons, região litorânea muito frequentada por milionários nova-iorquinos.

 “Encontramos a casa que ele precisava e lhe enviamos as fotos. Olhou-as e tomou a decisão em seguida.  Transferiu o dinheiro do carro mesmo,  e naquela noite, depois de uma limpeza e desinfecção profunda, instalou-se na casa com sua família para passar dois meses”, conta Shapiro por telefone.

  • Uma das praias de East Hampton, no Estado de Nova York. Crédito: GETTY IMAGES

 

Os celulares dos agentes imobiliários da região não param de receber pedidos semelhantes.As perspectivas de confinamento na cidade de Nova York   um dos epicentros globais da pandemia do coronavírus Sars-CoV-2, produziu um elitista êxodo para lugares mais abertos e espaçosos onde passar essa etapa. A migração começou há três semanas. Os rumores de uma quarentena generalizada e iminente se espalhavam pelos grupos de WhatsApp. Quem tem segundas residências (ou terceiras, ou quartas, ou quintas) correram para ocupá-las. E a demanda de aluguéis por temporada disparou nos destinos de veraneio habituais dos nova-iorquinos mais ricos. Porque o coronavírus não conhece fronteiras geográficas, mas as de classe são mais difíceis de desmontar.

Alguns chegam precedidos da sua própria equipe de faxina. Outros contratam uma empresa para isso e pedem que a desinfecção de cada cômodo seja gravada em vídeo. “Ninguém mais confia em ninguém”, explica Shapiro.

“Esses clientes pedem piscinas, geladeiras adicionais e quadras de tênis. E também caprichos mais extravagantes: de assessoria para celebrar “uma festa de aniversário virtual para uma criança” até “um jogador de tênis profissional para pegar bolas”.

A alta temporada nos Hamptons costuma ir do final de maio ao começo de setembro. Mas agora os preços cobrados já estão no nível máximo.  “Inclusive estamos tendo que falar com proprietários que normalmente não alugam suas casas, pedindo-lhes que coloquem suas propriedades no mercado ao preço que quiserem”, relata Shapiro. “Este será o ano de maior ocupação da história dos Hamptons.”

O fenômeno se repete em outros destinos de luxo próximos a grandes cidades norte-americanas, como San Francisco e Chicago. É uma exceção num setor, o de viagens, que basicamente se evaporou devido à pandemia.

Esta espécie de férias de verão antecipadas, em meio a uma emergência sanitária sem precedentes, traz desafios para as autoridades locais. Em muitas destas localidades, preocupa a capacidade da limitada infraestrutura hospitalar para responder a um eventual aumento de pessoas que necessitem hospitalização nas próximas semanas.

“Não viajem para cá vindo de outra zona que esteja experimentando uma transmissão alta da Covid-19.

Esta região tem recursos sanitários limitados, também há estoques limitados de alimentos e outros produtos essenciais”, disse em nota os serviços de emergência do condado rural de Schoharie, nos montes Catskills, outro popular destino turístico para os nova-iorquinos.

“Pela saúde e bem-estar da comunidade”, anunciavam as autoridades de uma ilha entre Long Island e Connecticut, “se as pessoas não precisam vir agora à Fishers Island por uma razão específica, imploramos que adiem sua viagem em pelo menos um mês”.

Do outro lado do país, na fronteira entre a Califórnia e Nevada, Carol Chaplin, diretora da autoridade de turismo do lago Tahoe, tinha uma mensagem semelhante para quem escapa do confinamento: “Isto é algo que achei que nunca teria que dizer em toda a minha carreira no turismo, mas, por favor, fiquem em casa neste momento”, afirmou ela em um comunicado nesta segunda-feira.

Também a convivência entre moradores e visitantes se viu afetada. Sobretudo desde que, na semana passada, a Casa Branca recomendou a todos os que tiverem saído da cidade de Nova York que se submetam a uma quarentena de 14 dias. A súbita provisão de alimentos por parte de algumas famílias recém-chegadas, além disso, provocou desabastecimento em alguns comércios.

“Sempre houve certa relação de amor e ódio entre os locais e os veranistas”, explica Shapiro. “A economia local é alimentada pelos visitantes. Os locais adoram odiá-los, mas também adoram seu dinheiro. Isso sim, quando algum entra em pânico e pede metade da carne que há num açougue, como aconteceu, os comerciantes tiveram que tranquilizar essa pessoa e lhe recordar que, por enquanto, os produtos continuam sendo repostos diariamente.”

*Fonte: El País

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