Berço de grandes artistas da MPB, samba-reggae, rock, pagode, axé e de diversos outros gêneros e ritmos, Salvador tem na música uma de suas principais manifestações culturais. E pela primeira vez em seus 472 anos de história, a capital passa a contar com um espaço de celebração e de conhecimento dessa expressão artística com a implantação da Cidade da Música da Bahia, novo museu instalado pela Prefeitura de Salvador no emblemático Casarão dos Azulejos Azuis, no bairro do Comércio.
Situado em uma localização estratégica e de fácil acesso – próximo ao Elevador Lacerda e ao Mercado Modelo, dois conhecidos cartões portais soteropolitanos -, o imóvel (foto) foi completamente recuperado pela Prefeitura e apresenta a história da música desde os tempos da colonização da primeira capital do Brasil até a explosão de diversidades sonoras dos tempos contemporâneos. Além disso, também será um centro cultural de produção de novas linguagens musicais, com aparelhamento técnico e estúdios para promover novos movimentos.
Gerenciado pela Secretaria Municipal de Cultura e Turismo (Secult), a Cidade da Música da Bahia possui 1.914,76 m² de área construída e possui quatro pavimentos, cuja imersão dos visitantes é proporcionada através da mais moderna tecnologia utilizada atualmente. O piso térreo conta com hall de entrada, recepção/bilheteria, salão de estar, café, loja, biblioteca, midiateca, centro de pesquisa, área de infraestrutura do centro cultural, secretaria, depósito, copa e área de funcionários. A partir daí, a viagem ao universo sonoro da capital baiana é monitorada através do próprio smartphone do visitante, a partir do sistema da Cidade da Música a ser acessado através de QR Code e mediante preenchimento do cadastro.
Demais pavimentos
Os pavimentos superiores abrigam acervos permanentes e estão sob as curadorias do antropólogo Antonio Risério e do arquiteto e artista Gringo Cardia, que também atuaram em outro equipamento municipal: a Casa do Carnaval da Bahia, na Praça da Sé. No primeiro andar da Cidade da Música, os visitantes se deparam com a exposição “A Cidade de Salvador e Sua Música”, que retrata bairros da cidade e suas músicas, histórias, depoimentos e novas tendências. O local dispõe de recursos audiovisuais através de uma grande maquete interativa, três grandes telas de projeção, estações de consulta e estúdio para gravação de depoimentos.
O segundo andar, por sua vez, possui na ambientação o tema da Tropicália com ilustrações gigantes de fragmentos da pintura modernista de Genaro de Carvalho. O local abriga a exposição “História da Música na Bahia” com nove cabines de vídeos, além de três salas.
Uma delas é intitulada “A Magia da Orquestra” e exibe conteúdo voltado para a música clássica, mostrando como funciona uma orquestra passo a passo, quais os instrumentos a compõe e vídeo gravado com a Orquestra Sinfônica da Bahia.
A sala “A Nova Música da Cidade” traz experiência imersiva com grande tela de 80 polegadas, onde passam vídeos com grupos novos, cantores em ascensão e grupos periféricos de música. O sistema de iluminação desse local acompanha as luzes do show ou clipe, dando a sensação ao visitante que ele está dentro da tela.
Já a sala “Quem Faz a Música da Bahia” é equipada com uma grande tela na qual são exibidos 260 depoimentos das pessoas mais importantes e representativas da música baiana. Lá, o público também tem acesso a uma edição do vídeo dinâmica em forma de roda de conversa, de maneira a ter um conteúdo interessante em qualquer momento que se entra nela.
O último pavimento da Cidade da Música da Bahia oferece entretenimentos educativos. Há três estúdios de gravação de clipes karaokê onde o visitante escolhe um fundo gráfico e, ao final, tem seu clipe pronto para postar em redes sociais. Uma estação de vídeo mostra todos os clipes que foram gravados. O conteúdo é acumulativo e dá para pesquisar quem gravou.
O cardápio de variedades segue com a sala do “Rap e Trap, poesia consciente” que mostra vídeos de vários rappers, trappers e poetas de todo o Brasil, em especial os artistas jovens da Bahia. Esse espaço tem um pequeno tablado no qual o visitante pode recitar seu rap ou poesia.
E mais: o público pode brincar com jogos da memória sobre a música da Bahia (várias imagens são escolhidas e viram cards informativos); Quiz Game (perguntas e respostas sobre a música baiana baseadas na exposição); e instalações interativas que simulam mesa de som. Nesses equipamentos, é possível mexer os canais de áudio de uma música e entender cada instrumento.
Além disso, há estações para exibições de documentários. Em uma delas dá para assistir depoimentos dos grandes percussionistas baianos e sobre a história da percussão no estado e no mundo. A outra apresenta os principais projetos sociais de música e juventude de Salvador, a exemplos do Pracatum, Projeto Axé, Quabales e Bagunçaço, entre outros.
O terceiro andar ainda tem sala especial de demonstração de um set de percussão onde as pessoas sentam em volta da mesa central. Um monitor do espaço cultural faz uma aula show com a participação final de todos os visitantes. Essa mesma sala está desenhada para ser um estúdio de gravação que acolherá o projeto “Novos Talentos”, no qual a Cidade da Música escolhe quatro jovens artistas por mês e produz a música e um clipe dos selecionados.
Recuperação
As intervenções no Casarão dos Azulejos Azuis tiveram investimento total de R$19,2 milhões, sendo R$11 milhões provenientes de financiamento junto à Corporação Andina de Fomento (CAF), através do Programa de Requalificação Urbanística de Salvador (Proquali), com intermediação da Casa Civil, e obras executadas pela Superintendência de Obras Públicas (Sucop), vinculada à Secretaria Municipal de Infraestrutura e Obras Públicas (Seinfra).
Para efetivar as obras de recuperação no lugar que agora passa a abrigar a Cidade da Música da Bahia, a Prefeitura promoveu estabilização do imóvel, em 2017, com a retirada dos escombros oriundos do desabamento da cobertura e consequentemente das estruturas em madeira abaixo dela. A partir disso, foi feita parcialmente a recuperação estrutural de elementos em concreto, remoção das esquadrias e vedação dos vãos visando a estabilização das fachadas, além de colocação de cobertura metálica provisória. Estas medidas foram providenciadas como parte inicial do projeto, garantindo que o prédio se mantivesse estável.
Já os azulejos portugueses nas cores azul e branco que compõem a fachada do casarão passaram por um trabalho minucioso de restauração, realizado em mais de 21 mil peças de revestimento, espalhadas entre as ruas Portugal e Bélgica.
Durante o processo de retirada dos azulejos (que medem 13,5 x 13,5 cada, e foram produzidos entre 1850 e 1860), foi empregada a técnica de faceamento – isto é, foi colado papel seda na face vidrada (onde fica a “estampa” das pedras), a fim de evitar danos ao desenho. Apesar de todos os cuidados na hora da remoção das pedras (a ação foi feita pelos técnicos com espátulas), nem todos os quadradinhos puderam ser reaproveitados devido à argamassa usada em diferentes períodos do passado.
Quando aproveitados, os azulejos retirados da fachada do casarão foram submetidos a diferentes etapas, passando por limpeza e mergulho em três tanques de água dessalinizada, antes de serem secados em uma espécie de estufa. O processo ainda envolveu lixamento, pintura à mão e aplicação de verniz. Todos os trabalhos aconteceram em um ateliê montado dentro da própria estrutura do casarão.
As peças com falta de pedaços também foram restauradas, mas houve também produção de outras para substituir as que não puderam ser aproveitadas. As novas unidades foram similares às originais e estiveram de acordo com diretrizes do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
História
O Casarão dos Azulejos Azuis foi tombado em 30 de julho de 1969 pelo Iphan, mas a história do imóvel é bem mais antiga. A fachada principal exibe dezenas de janelas de arcos em forma de ogiva, como em outros edifícios neogóticos.
O Guia dos Bens Tombados Brasil, do Iphan, cita que não há informações precisas sobre as origens do sobrado. Acredita-se que ele tenha sido construído entre 1851 e 1855. De lá para cá, o imóvel passou por diversas transformações, abrigando o Hotel Muller, ainda no século XIX, e até o supermercado Paes Mendonça na segunda metade do século XX.
Funcionamento
O funcionamento da Cidade da Música da Bahia será de terça-feira a domingo, das 10h às 17h. O valor do ingresso é R$20 (inteira) e R$10 (meia) – o benefício da meia entrada é extensivo a cidadãos residentes em Salvador, mediante comprovação de endereço. A visitação deverá ser feita através de agendamento prévio, a ser feito no site https://cidadedamusicadabahia.
*Fotos: Betto Jr – Secom