Por Paula Bebert
Romualdo Rosário da Costa, conhecido como Mestre Moa do Katendê, além de um dos maiores mestres de capoeira de Angola na Bahia, foi um dos grandes responsáveis pela reafricanização do carnaval de Salvador e compôs uma valiosa obra musical. Um dos fundadores do Afoxé Badauê, reintroduziu o ijexá na Música Popular Brasileira no final da década de 1970. Seu assassinato por razões políticas, em 2018, comoveu ativistas do mundo inteiro na luta por liberdade, defesa da democracia, justiça racial e respeito às artes – mas foi a sua vida de pouco menos de 64 anos que efetivamente representou essas premissas.
Sete anos antes de sua morte, Moa fez o registro sonoro de suas músicas no estúdio do amigo e produtor musical Átila Santana, que, agora, assume a frente do projeto de lançamento do álbum “Moa Vive!”, contemplado pelo Rumos Itaú Cultural 2019-2020. Foto: Isabella Rudge.
O primeiro single do disco, “Presente de Oxum”, interpretado pelo cantor Gerônimo Santana, estará nas plataformas de streaming no dia 21 de outubro, poucos dias antes da data de aniversário do Mestre, nascido em 29 de outubro de 1954.
Faixa “Presente de Oxum” cantada por Gerônimo (foto-divulgação) está disponível nas plataformas de streaming e é a primeira das nove músicas que compõem o disco a ser lançado em novembro.
Assista ao teaser: https://bit.ly/teaser-
Dessa gravação intimista entre amigos, a produção das faixas agora ganha novas roupagens nas vozes de artistas da Bahia que se afiliam profundamente à obra do homenageado: Margareth Menezes, Russo Passapusso, Roberto Mendes, Mateus Aleluia Filho, Márcia Short, Aloísio Menezes, Sued Nunes e Gerônimo Santana. O disco contará com nove canções – sete regravadas e duas das gravações originais, com a voz do próprio Moa.
Na instrumentação, estão músicos talentosos como Mestre Jorjão Bafafé, Gabi Guedes, Felipe Guedes, Roberto Mendes, Ivan Sacerdote, Mateus Aleluia Filho, Marcos Santos, Vinicius Freitas, Zanah Santos, Sebastian Notini, Matias Traut, Juliano Oliveira e o próprio Átila Santana, que assina a produção musical.
A seleção das canções se baseou na força representativa, na versatilidade e na diversidade da obra existente, bem como na importância delas para o diálogo com o panorama da produção musical brasileira atual. Como resultado, as músicas revelam a habilidade de Moa em se conectar com o tempo presente, mantendo suas conexões com a cultura afro-brasileira, os afoxés, o samba duro, a MPB, a capoeira e as religiões de matriz africana.
Além do lançamento do álbum, previsto para 11 de novembro, o projeto vai apresentar um minidocumentário de 20 minutos, com depoimentos de familiares e artistas nos bastidores da produção do disco. O objetivo é de aproximar gerações através da música de matriz africana, valorizando obras que marcaram o repertório de Moa no ijexá, unindo-se com afrobeats, samba de roda, funk e samba duro.
SOBRE MOA DO KATENDÊ – Referência da cultura afro-brasileira, o soteropolitano Romualdo Rosário da Costa, ou Mestre Moa do Katendê, nos deixou importantes produções nas áreas de música, dança, capoeira, artesanato, confecção de instrumentos musicais de origem africana e organização comunitária.
Desde a década de 1970, Moa exercia um importante papel de educador, mobilizador comunitário e agitador cultural na comunidade do Dique Pequeno, no bairro do Engenho Velho de Brotas, em Salvador. Engajado no processo de afirmação identitária da juventude negra, mobilizou seus talentos para concretizar um projeto político-cultural de reafricanização do carnaval baiano. Daí seu empenho em criar um afoxé e promover a participação de artistas e moradores da comunidade do Dique Pequeno. Nesse contexto, foi vencedor do festival de compositores do Ilê Aiyê, em 1977, fundou o Afoxé Badauê um ano depois e o Afoxé Amigos do Katendê em 1995.
O Badauê adquiriu grande importância no cenário cultural da cidade no final dos anos 1970 e no começo da década de 80. O bloco foi uma das maiores influências rítmicas da MPB da época – artistas como Gilberto Gil, Caetano Veloso, Moraes Moreira, Djavan e muitos outros beberam da fonte ijexá que jorrava do Engenho Velho de Brotas. Congregando a juventude negra de distintos bairros e chegando a ter sete mil membros em um único carnaval, o Badauê alcançou o objetivo maior de um afoxé: levar às ruas a riqueza cultural negra na expressão de corpos, sons e imagens. A projeção nacional se firmou quando Caetano Veloso homenageou o bloco com a canção “Badauê”, no disco “Cinema Transcendental” (1979).
Como mestre de capoeira e dança afro, Moa viajou pelo país ao longo de quatro décadas, ajudando a criar grupos de cultura afro-brasileira. Desse modo, ele acabou por obter maior reconhecimento enquanto mestre de capoeira e professor de dança afro do que como compositor ou músico. Sua música, porém, é agora reapresentada ao público em letras e melodias, para que seu legado seja perpetuado e ganhe o devido reconhecimento.
Sobre o Rumos Itaú Cultural
Um dos maiores editais privados de financiamento de projetos culturais do país, o Programa Rumos é realizado pelo Itaú Cultural desde 1997, fomentando a produção artística e cultural brasileira. A iniciativa recebeu mais de 75,8 mil inscrições desde a sua primeira edição, vindas de todos os estados do país e do exterior. Destas, foram contempladas 1,5 mil propostas nas cinco regiões brasileiras, que receberam o apoio do instituto para o desenvolvimento dos projetos selecionados nas mais diversas áreas de expressão ou de pesquisa.
Os trabalhos resultantes da seleção de todas as edições foram vistos por mais de 7 milhões de pessoas em todo o país. Além disso, mais de mil emissoras de rádio e televisão parceiras divulgaram os trabalhos selecionados.
Na última edição, de 2019-2020, os 11.246 projetos inscritos foram examinados, em uma primeira fase seletiva, por uma comissão composta por 40 avaliadores contratados pelo instituto entre as mais diversas áreas de atuação e regiões do país. Em seguida, passaram por um profundo processo de avaliação e análise por uma Comissão de Seleção multidisciplinar, formada por 23 profissionais que se inter-relacionam com a cultura brasileira, incluindo gestores da própria instituição. Foram selecionados 90 projetos.