Mais bicicletas e mais impostos: assim se combate o excesso de turismo

Por Joana Capucho
Promover eventos nas zonas menos visitadas das cidades; realizar atividades fora dos meses de verão; criar zonas pedonais; rever a regulamentação e as taxas na hotelaria; fomentar a troca de experiências entre moradores e visitantes; e estimular a utilização de bicicletas. Estas são algumas das medidas que constam do mais recente relatório da Organização Mundial de Turismo (UNWTO), que pretende ajudar as cidades a gerir o crescimento do turismo urbano e o seu impacto no espaço e nos residentes.

Em comunicado, a OMT explica que o crescimento do turismo requer políticas e práticas que minimizem os efeitos adversos deste sobre os recursos naturais, as infraestruturas, a mobilidade e o congestionamento, bem como o impacto sociocultural. Até porque, lê-se no documento, têm aumentado os relatos de atitudes negativas das populações residentes em relação aos visitantes, relacionadas com a sobrelotação, o ruído e outras questões, o que levou ao surgimento de termos como “overtourism” e “turismofobia”.

Com o aumento do número de turistas, diz a OMT, é preciso que haja uma gestão sustentável para os visitantes e as comunidades locais, o que se consegue com o envolvimento destas, a redução da sazonalidade e a definição de limites que respeitem a capacidade e especificidade do destino. A capacidade é, segundo esta organização, “o número máximo de pessoas que podem visitar um destino ao mesmo tempo, sem destruir o ambiente físico, económico e sociocultural e sem uma diminuição inaceitável na qualidade e satisfação dos visitantes”.

As estratégias propostas no documento passam por promover a dispersão de visitantes (no espaço e no tempo), criar novos itinerários e atrações, melhorar as infraestruturas e facilidades, reformular e adaptar a regulamentação, melhorar a segmentação de visitantes, garantir que as comunidades locais beneficiam do turismo, criar experiências que beneficiem residentes e visitantes, arranjar formas de envolver ambos e definir medidas de monitorização e resposta.

“A governação é a chave. Abordar os desafios que o turismo urbano enfrenta hoje é uma questão muito mais complexa do que geralmente é reconhecido. Precisamos de criar um roteiro sustentável para o turismo urbano”, disse o secretário-geral da OMT, Zurab Pololikashvili.

Em Portugal, é sobretudo em Lisboa e Porto que se faz notar uma maior pressão turística. Na capital, o número de pessoas que visita a cidade (4.5 milhões) já é nove vezes superior ao número de moradores (504 mil). Já no Porto, de acordo com os dados do Instituto de Planeamento e Desenvolvimento do Turismo (IPDT), há 1.6 milhões de turistas por ano para 214 mil residentes. O que faz com que a pressão turística nas duas cidades seja superior à de Londres, Praga ou Barcelona.

No ano passado, a taxa de ocupação hoteleira em Lisboa – onde os visitantes pagam um euro de taxa turística – atingiu os 80.2%. Segundo o “Atlas da Hotelaria”, da consultora Deloitte,esta taxa coloca a capital portuguesa no segundo lugar do ranking da Europa, abaixo de Amesterdão e à frente de cidades como Paris, Londres, Madrid e Barcelona.

Há atmosfera internacional, mas casas demasiado caras

O relatório destaca, ainda, os aspetos positivos do turismo percecionados pelos locais: uma atmosfera internacional, mais eventos, uma imagem mais positiva das cidades, a proteção das zonas históricas e a restauração da arquitetura tradicional.

Por outro lado, lamentam, aumenta o preço das casas, dos táxis, das lojas, dos restaurantes, dos cafés e dos transportes públicos.

Segundo a mesma investigação, a maioria das pessoas entrevistadas acha que “não deve haver limitações ao crescimento do número de visitantes” e só “uma pequena percentagem considera que o desenvolvimento e marketing do turismo devem ser travados”.

A organização quer uma maior monitorização de movimentos e impactos do turismo e dá o exemplo de uma iniciativa em Lisboa e no Porto, numa colaboração com a Nova SBE e com a NOS, que usa dados móveis e da plataforma AirBnb para estudar a pressão do turismo nas duas cidades. O objetivo é compreender o comportamento dos turistas, nomeadamente qual número de dias que ficam, um roteiro típico, atrações favoritas e decisões. Numa segunda fase, serão desenhadas recomendações e ações concretas para serem tomadas pelas autoridades do setor.

No ano passado, o então secretário-geral da OMT disse que a falta de empatia que existe em várias cidades com os turistas resulta das “más práticas” na gestão pública, que não favorecem a sustentabilidade desses locais. “Em lugares como Barcelona, Veneza, Dubrovnik, Roma (…), onde os turistas vão todos ao mesmo tempo e enchem a cidade, aí há um problema, pois não se está a gerir bem”, assinalou Taleb Rifai, ao falar na cidade argentina de Mendoza, que acolheu a Conferência Mundial de Enoturismo, promovida pela OMT.

Na opinião deste jordano, “não há que ter medo” do crescimento do turismo, mas sim de uma má gestão destas multidões. Por isso, defendeu a necessidade de políticas sustentáveis, que levem os turistas a visitar sítios diferentes e não o mesmo lugar ao mesmo tempo.

A OMT conduziu inquéritos a 3.153 pessoas nas oito cidades, mais 25 entrevistas abertas por cidade para este relatório. Para chegar às medidas, conduziu entrevistas num total de 18 cidades, com vários representantes e pessoas de influência locais. A agência estima que o setor do turismo continue a crescer 3,3% por ano até 2030, altura em que atingirá os 1,8 mil milhões de turistas.

Diário de Notícias Com Lusa

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