Tem de se confiar na resiliência do turismo”. Esta é uma das declarações que mais se lê ou ouve quando se questiona sobre a sobrevivência do turismo em Portugal e no mundo face à atual crise econômica provocada pela pandemia da Covid-19.
É certo que a economia é de ciclos e que depois da crise econômica de 2008 aguardava-se que outra crise ocorresse. Contudo, ninguém esperava ou estava sequer preparado para uma crise a este nível em que, os aviões estão em terra, os aeroportos já não estão a rebentar pelas costuras, as ruas dos principais destinos turísticos estão desertas e longe do ‘overtourism’, e as unidades de alojamento turístico ou estão encerradas ou a servir de apoio aos profissionais de saúde.
Muito mudou com a atual situação e vai certamente mudar nos próximos tempos. No entanto, quisemos saber de que forma a crise pandêmica impactou na atividade das empresas turísticas a operar em Portugal e quais as consequências que daqui advêm. Para tal, realizamos um inquérito junto de alguns dos principais players da hotelaria, distribuição, animação turística e eventos, e transportes de 1 a 5 de abril. Contamos com 91 respostas, 49,5% da área de animação turística e eventos, 22% da hotelaria, 18,7% da distribuição e 9,9% dos transportes.
Foram várias as questões abordadas, desde a adequação do modelo de negócio, às medidas adotadas, às quebras registadas e às possíveis perspetivas quanto ao futuro do Turismo em Portugal. Apesar de resiliente, as respostas não são animadoras. Como já referido, ninguém estava preparado para uma crise desta dimensão e origem e nem as empresas. Dos inquiridos, 42,9% admite que o modelo de negócio da sua empresa é “extremamente inadequado” para fazer frente à presente crise, enquanto 17,6% considera que é “parcialmente inadequado”.
Com modelos preparados para fazer face a uma situação deste gêneros estão apenas 20,9% que indica que o seu modelo de negócio é “parcialmente adequado” e 2,2% “extremamente adequado”. Os restantes 16,5% ainda não conseguem fazer uma avaliação considerando assim, “nem inadequado, nem adequado”.
Quanto ao impacto econômico, e apesar da principais quebras se virem a verificar neste mês de abril, existiram empresas turísticas que já verificaram diminuições consideráveis na sua faturação no passado mês de março. Concretamente, cerca de 43% teve quebras compreendidas entre 80% a 100%, enquanto 36,3% registou quebras entre os 50% e os 79% na sua faturação, apenas 8,8% ficaram abaixo dos 20% de diminuição de faturação (ver gráfico 01).
Para fazer face a estas diminuições de faturação, houve muitas empresas que adotaram várias medidas de redução de custos. A redução de custos operacionais lidera as ações das empresas, com 86,8% dos inquiridos a tomarem esta medida, seguindo-se uma redução nos salários (58,2%) e um corte junto dos fornecedores (52,7%).
Também a comunicação do negócio esteve entre as opções adotadas. Houve ainda quem tivesse optado por uma redução da sua equipa (44%), estando a opção do regime de ‘lay off’ entre as mais selecionadas, seguindo-se férias, despedimento (30,8%) e assistência à família. Apenas três dos inquiridos referem ter atribuído licenças sem vencimento, enquanto outros tantos optaram pela não renovação de contratos, alguns dos quais em período experimental.
No entanto, dos 91 inquiridos, 7,7% afirma não ter efetuado qualquer redução de custos no seu negócio.
Apoios
Foram várias as medidas de apoio às empresas anunciadas pelo Governo, linhas de crédito, flexibilidade com impostos e regime simplificado de acesso ao ‘lay off’ foram algumas delas. Questionados sobre como avalia estas medidas governamentais de uma forma geral, 40,7% considera que são moderadamente adequadas, enquanto 25,3% aponta como pouco adequadas e 11% a indicar como inadequadas. Apenas 23,1% considera que foram adequadas ou muito adequadas.
Apenas 8,8% considerou não recorrer a nenhuma das medidas disponibilizadas pelo Governo. Contudo, a que ganhou mais adeptos foi o acesso ao regime de ‘lay off’, seja em suspensão do contrato de trabalho (69,2%) como de redução do horário de trabalho (38,5%).
A flexibilização da liquidação de contribuições sociais também foi uma medida a que 53,8% recorreu, enquanto 50,5% diz também ter optado pela flexibilização no pagamento de impostos. Às linhas de crédito disponibilizadas, apenas 44% afirma que vai recorrer, enquanto 40,7% optou pelas moratórias bancárias. Apenas 11% optou por usufruir do plano extraordinário de formação.
No entanto, existem várias medidas complementares que os empresários inquiridos propõem para ajudar a garantir a sobrevivência ou sustentabilidade do seu negócio ou até ajudar na retoma do Turismo em Portugal.
Perspectivas
O turismo já ultrapassou várias crises, sejam econômicas como de segurança ou de saúde, mas atualmente a incerteza é o que marca o futuro a médio e longo prazo. A maioria dos empresários (64%) considera que a atividade turística só deve retomar à normalidade após um ano, sendo que destes, 26,4% acredita que vai durar mais do que um ano para retomar (gráfico 02). Apenas 7,7% aponta que dentro de três meses o Turismo já deverá dar sinais positivos, já 19,8% considera que teremos de aguardar seis meses para tal. Porém, 95,6% dos inquiridos não perspetivam ter qualquer crescimento nas suas receitas em 2020.
Lisboa é, de longe, a região onde se prevê verificar uma recuperação mais rápida do turismo, com 51,1% dos inquiridos a apontar nesse sentido, seguindo-se a região algarvia com 23,9%. No sentido inverso, a recuperação deve-se fazer mais lentamente no Norte do país (36,8%) e na região Centro (18,4%), as restantes regiões terão recuperações menos lentas, como se pode verificar no gráfico 03.
Vários especialistas já vieram notar que a forma como se viajava e fazia turismo antes da pandemia não se deverá manter. Será um novo paradigma na forma de viajar, ainda a avaliar nos próximos tempos, bem como o posicionamento que os destinos e empresas turísticas deverão adotar nas suas estratégias.
Para já, é o mercado interno que vai estar no foco das estratégias turísticas das empresas e aquele que 73,3% considera que melhor responderá à retoma do Turismo em Portugal. Contudo, 15,6% indica que tanto o mercado interno como o externo vão ter a sua contribuição para a retoma turística. Dados que levam a concluir que, pelo menos a médio prazo, vai-se ouvir falar mais a língua portuguesa nos principais destinos turísticos nacionais.
Amostra
Do total de 91 respostas ao inquérito realizado entre 1 e 5 de abril, 44% dos inquiridos foram microempresas, ou seja, empresas com menos de 10 trabalhadores e menos de 2 milhões de euros de faturação. 20,9% foram pequenas empresas com menos de 50 trabalhadores e menos de 10 milhões de euros de faturação. Das respostas, 15,4% foram médias empresas com menos de 250 trabalhadores e menos de 50 milhões de euros de faturação. 8,8% foram grandes empresas com mais de 250 trabalhadores e mais de 50 milhões de euros de faturação. As restantes empresas não se enquadravam em nenhuma das opções.
*Fonte: Publituris/PT