Por Guilherme Reis, Paulo Roberto Sampaio e Rodrigo Daniel Silva
O secretário estadual de Turismo (Setur), Fausto Franco, acredita que a recuperação do turismo na Bahia só acontecerá a partir de 2023. Embora aposte que 2021 será melhor do que ano anterior, o titular da Setur avalia que o cenário ainda será muito difícil por causa da pandemia da Covid-19.
“Esse ano será de muitas barreiras para serem vencidas. Em 2022, vamos respirar melhor para, em 2023, ter um fluxo retomado”, ressaltou, em entrevista à Tribuna. Franco disse ainda que, só com o cancelamento do Carnaval, a estimativa é que a Bahia perca mais de R$ 1 bilhão neste ano.
“No caso da Bahia, que tem um carnaval, um réveillon, festas de aglomeração, as nossas perdas são muito maiores do que os estados que não têm essa característica”, frisou. Ainda na entrevista, o secretário fala sobre as ações da pasta para minimizar o efeito da pandemia, e critica a postura do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no enfrentamento à doença. Fausto falou ainda sobre a importância da reativação de 16 sinos da Basílica Santuário Nossa Senhora Conceição da Praia, no bairro do Comércio, em Salvador, que voltaram a ecoar depois de 30 anos, com a ajuda de um sistema totalmente automatizado.
Tribuna – Como o senhor avalia o impacto da pandemia da Covid-19 no setor do turismo da Bahia?
Fausto Franco – Muito ruim, né, porque o turismo junto com o entretenimento foi o setor mais atingido e o que mais vai demorar a voltar na sua plenitude. E ninguém estava preparado no mundo para uma pandemia dessa proporção e dessa longevidade, que está se apresentando. Então, evidentemente, o impacto foi muito grande. A gente teve, no primeiro momento, os fechamentos restaurantes, pousadas e hotéis, que fecharam por não ter volume de pessoas. Para ter uma ideia, em Salvador, no final de março a abril, ficou com quatro voos diretos diários. Cerca de 95% a menos da capacidade de fluxo de voos. Foi uma parada brutal de toda a cadeia produtiva. Lá para junho, julho, a gente começou a ter uma reabertura ainda tímida e, a partir do feriado de 7 de Setembro, começamos a ter um leve retorno. Tivemos um final de ano intenso, mas, se comparar com 2019 e 2020, muito menor. Nós tivemos 63 navios de cruzeiro parando somente na capital baiana, e esse ano tivemos zero. Então, é evidente tivemos menos fluxo. Conseguimos voltar com 85% da malha área do que tinha pré-pandemia, mas mesmo assim aquém do que deveria ter. Comparado com outros estados, nosso aumento foi muito significativo. Por quê? Algumas razões explicam isso. A Bahia é um estado muito central sob o ponto de vista geográfico. A gente é o único estado que faz fronteira com mais oito estados. Então, uma pessoa que sai hoje de São Paulo e vai para Porto Seguro gasta 1 hora e meia. Para Fortaleza, gasta 3 horas e meia. É muito mais confortável (ir para a Bahia), do ponto de vista psicológico da palavra. Então, isso nos ajudou e a gente teve um fluxo grande de ocupação. Não só de hotel, mas de aluguel de casas também. O índice chegou a 100% de ocupação. Agora, em fevereiro, por conta dessa segunda onda, a gente está bastante atento porque houve uma diminuição grande de reservas, em virtude também de não haver carnaval. A gente vai ter um cenário de 21 ainda muito difícil. Estamos fechando junto com a Seplan (Secretaria de Planejamento) e a Sefaz (Secretaria da Fazenda) as perdas que o carnaval vai representar para o estado financiamento. Mas asseguro que as perdas são muito grande, com certeza, passando de R$ 1 bilhão. Mas não ainda não tenho esse número de forma oficial. No caso da Bahia, que tem um carnaval, um réveillon, festas de aglomeração, as nossas perdas são muito maiores do que estados que não têm essa característica.
Tribuna – Há alguma possibilidade de haver carnaval ainda neste ano?
Fausto Franco – A gente não vai ter festa de aglomeração no formato que nós conhecemos sem antes a grande maioria da população estar vacinada. E, pelo ritmo das coisas, pelo negacionismo do governo federal, a gente ainda está muito aquém do que precisa. É muito improvável a gente ter festa de aglomeração no formato que a gente conhece em 2021.
Tribuna – Quais são as ações que a Secretaria de Turismo tem implementado para minimizar as perdas no setor?
Fausto Franco – A gente entende que pode fazer turismo, sem necessariamente aglomeração. Essa semana passou por aqui o Rali Náutico. São 160 jet skis que saíram de Salvador para Ilhéus, passando por Barra Grande, Porto Seguro e Itacaré. Todos os competidores fizeram teste. Oito deram positivo e não participaram do evento. Então, se pode fazer atividades sem aglomerar. A gente tem maior litoral do Brasil, tem história, cultura, arte, gastronomia. Tem coisas que a gente pode fazer sem necessariamente aglomerar. A gente tem que enaltecer o turismo regional, turismo de família, para destinos mais próximos. Às vezes, de carro. Temos que aproveitar essas janelas e criar possibilidades.
Tribuna – Só com a vacina contra a Covid-19 é que vamos ter realmente uma retomada da economia?
Fausto Franco – Sem dúvida. A recuperação do turismo na sua forma linear acredito que só aconteça mesmo em 2023. 2021 será um ano muito difícil, mas de muita esperança porque as pessoas, de alguma forma, já estão começando a se vacinar. Tem se aumentado a quantidade de vacinas. Existe uma fila grande de prioridades e o mundo inteiro desejando a vacina, mas já é um alento. Mas a gente só vai ter uma normalidade a partir de uma imunização coletiva, e dificilmente vai acontecer nesse ano de 2021. Esse ano será de muitas barreiras para serem vencidas. Em 2022, vamos respirar melhor para, em 2023, ter um fluxo retomado.
Tribuna – Mas 2021 será melhor do que o ano anterior? Essa é a projeção?
Fausto Franco – Melhor sim, mas muito diferente e aquém da pré-pandemia. Isso é inegável. Mesmo com algumas pessoas vacinadas, a gente não pode esquecer que a pandemia continua entre nós. Existem muitas pessoas com receio de viajar, de se expor, de consumir. Então, não dá para dizer que vai ser igual a 2019, por exemplo. Mas será melhor do que 2020, porque a própria ciência está mais preparada para o vírus. A gente conhece mais o vírus. A gente tem mais preparada. As pessoas estão cansadas do isolamento social, apesar do vírus estar cansado da gente. Mas existe um desejo de viajar. Isso mostras as pesquisas no Brasil e no mundo que as pessoas querem viajar. Até a forma da gente fazer encontros no turismo de negócios, hoje é tudo virtual. E isso vai impactar na quantidade de voos. Não é só no Brasil, mas no mundo inteiro. Quem pagava, sustentava a malha área era o turismo de negócios. Hoje em dia, se você tinha 20 voos de Salvador para São Paulo, tem 10 porque não tanta necessidade de visitar clientes que já estão na sua rede. Consequentemente, é que esses voos fiquem mais caros, e fique mais difícil fazer turismo. Aí é que pode ter a oportunidade já que vai ter uma sobra de avião, de piloto, para fazer o turismo de experiência, de contemplação. É a oportunidade que vai surgir, mas terá muito menos fluxo de Salvador para São Paulo.
Tribuna – Como o senhor avaliou as medidas adotadas no início da pandemia, que impactaram o turismo?
Fausto Franco – Super necessárias. Se olhar a postura do governador Rui Costa desde o primeiro momento da pandemia, é de muito respeito à ciência, à medicina. Inclusive, com a união, na época, com o prefeito ACM Neto e agora com o prefeito Bruno Reis, apesar das diferenças políticas e ideológicas. A população foi colocada sempre em primeiro lugar. Se comparar a Bahia com outros estados, a gente tem uma situação relativamente confortável ao vírus, mostrando um equilíbrio entre os gestores. Infelizmente, a gente não vê esse equilíbrio, liderança, em nível nacional. Um dos motivos que as pessoas preferem ir para a Bahia é porque entende que aqui tem liderança. Infelizmente, em outros estados, não há nenhum tipo de controle, de questionamento ao modo como a população usa o serviço, os bares, restaurantes, praias. Agora, não adianta o Estado fazer a parte se a população não entender que precisa fazer isso. Não tem polícia, estrutura estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Se a população não tiver consciência, não tem gestor público que dê jeito.
Tribuna – O senhor acha que, se a postura do governo federal e da população tivesse sido diferente, a gente estaria com mais possibilidade de retomar o turismo e a economia de modo geral?
Fausto Franco – Certeza absoluta, se desde o primeiro momento o governo federal tivesse entendido a gravidade. Com o ministro (da Saúde, Luiz Henrique) Mandetta, estava tendo uma postura muito coerente e o presidente da República começou a ignorar, a passar por cima do que o ministro falava. Tanto é que ele acabou saindo. Imagine que o líder maior da nação que aglomera, não usa máscara, diz que é gripezinha, a população de modo geral fica no mínimo confusa. Quem vou ouvir? Quem vou obedecer? Faltou e continua faltando essa liderança nacional para agir com coerência, seriedade e equilíbrio.
Tribuna – Teremos a reativação dos sinos das igrejas em Salvador. Qual a importância desta medida?
Fausto Franco – É muito singular. Primeiro é um projeto que eu tive a ideia logo quando cheguei na secretaria. A gente não via essas igrejas tocando os sinos. Eu sempre viajei muito para fora, e via que os sinos tocavam. E voltei com isso na cabeça, muito inquieto. E insisti no projeto. Descobri uma igreja no Rio de Janeiro que tinha esse sistema que pode programar os horários, e tinha chancela do Iphan. Fui atrás de benfeitores simpáticos à causa. Isso foi ganhando corpo. Hoje, temos nove igrejas e a Conceição da Praia (foto) tem uma particularidade ímpar, porque é a única igreja que tem 16 sinos e que pode tocar músicas sacras. E é a nossa padroeira. Tem todo esse simbolismo que vai repercutir não só para os baianos, mas também para os turistas. Independente da religião. O sino é um chamamento a Deus no momento em que a gente precisa de um algo para nos confortar, para termos de amuleto, alicerce. Estou muito feliz com a repercussão que esse projeto tem tido, com os benfeitos que têm apoiado essa iniciativa. E a gente tem expandido para o interior do estado, que tem muitas igrejas com potencial turístico, histórico maravilhoso e precisa ser mais valorado.
Tribuna – Como estão as obras do Prodetur? Sofreram impactos por causa da pandemia?
Fausto Franco – Sim. Bastante, porque teve algumas coisas fugiram totalmente do controle. Primeiro, a pandemia, que nós já falávamos. Tivemos em 2020 o ano mais chuvoso dos últimos 40 anos. Tivemos, principalmente, no segundo semestre, muita falta de insumos até em questão do auxílio emergencial. Isso tudo fez atrasar as obras. A gente gostaria de ter entregue antes do verão, mas não foi possível. Mas todas estão em fase bem adiantas. Algumas estão com 90% de execução. A gente vai entregar todas as intervenções ainda no primeiro semestre de 2021, e isso vai dar uma nova guinada no nosso turismo. Fora isso, estamos investindo na qualificação de mão de obras. Não adianta investir em atracadores, por exemplo, se a população não entender o bem que tem para ela.
Tribuna – A ponte Salvador-Itaparica trará benefícios para o turismo?
Fausto Franco – Não só para o turismo, mas para a economia do estado como um todo, porque a ponte vai deixar o estado muito mais perto da sua capital. Alguns municípios vão chegar a 250 quilômetros de distância a menos. Regiões serão beneficiadas. Muitos empresários do Brasil e do exterior com interesse, alguns com terrenos adquiridos. Isso vai ser um novo vetor de desenvolvimento do estado como um todo. O turismo será protagonismo, mas toda a cadeia produtiva vai ganhar com essa ponte. Só com empregos diretos na construção serão 10 mil pessoas, em momento que a gente precisa de emprego e renda para o estado. Acho que esse projeto vem um momento muito oportuno para todos nós.
*Fonte: Tribuna da Bahia, media partner do Portal Turismo Total; Foto dos sinos, crédito Paula Froes