Por Paulo Atzingen (De Belo Horizonte)*
Toda sinuosidade da obra de Oscar Niemeyer começou aqui na Pampulha inspirada pelas corcovas das montanhas mineiras, como todos sabem.
Assim como a Igreja de São Francisco, o Iate Tênis clube, a Casa do Baile e o Museu de Arte da Pampulha formam um conjunto harmonioso, a amizade que brotou entre Juscelino Kubitschek e o arquiteto prova que há um ingrediente poderoso nos laços de amizade que é a afinidade. O que seria de Juscelino sem Niemeyer e este sem aquele?
Arrisco-me a dizer que a amizade é mais forte em Minas Gerais e ela tem alguns ingredientes essenciais: a arte, o artesanato, a música, a dança, a arquitetura. Somos amigos quando criamos e contemplamos.
Somos mais amigos quando relaxamos e lemos o mundo, as coisas externas e o outro. Somos mais amigos quando estamos abertos à arte.
Paredes de estrofes e versos
Vejam as letras do Clube da Esquina. Puras, leves, transparentes como as águas das nascentes de Minas. Essas aguas brotaram da amizade entre os músicos Milton Nascimento, Toninho Horta, Wagner Tiso, Lô Borges, Beto Guedes e Márcio Borges. Amizade, afinidade, música, arte e o processo criativo ergueram as paredes desse clube de estrofes, versos e canções.
As linhas de Niemeyer são limpas e simples como deveriam ser as amizades e os versos. O traço, quase que um rabisco, torna-se um monumento modernista preenchido de cimento, aço e areia, no entanto o que vemos – o perceptível – não está no miolo, mas na superfície limpa, leve, quase que óbvia. As amizades são assim (ou deveriam ser), limpas, leves, quase óbvias, porque repousam sobre a simplicidade.
Afinidade
Somos amigos também por afinidade. Nessa viagem para BH pude conhecer ainda mais os amigos mineiros Marden e Luana, organizadores do #vemprabh. São incansáveis batalhadores e defensores do turismo de Minas Gerais. Profissionais da palavra e da imagem defendem suas cores e sua cultura com amor e com autenticidade.
Não havia ainda dimensionado o trabalho dos dois em Minas e agora pude comprovar que o casal é como goiabada e queijo, cada um com sua força, contribuição e sabor. Conseguiram de uma tacada só reunir iniciativa privada e poder público para juntos apresentarem a amizade mineira, a afinidade que todos nós, brasileiros, temos com Minas. Eles sim, desenvolvem à sua maneira, o mais belo processo criativo.
Arrisco dizer que somente as amizades e os relacionamentos consistentes (além da fé) nos sustentam e nos deixam em pé em uma época tão excludente e em um país onde temos que nos superar diariamente e nos cuidar no âmbito do politicamente correto e nos proteger para não sermos mortos ali na esquina.
Gaita e amizade
Mas foi em minha rápida passagem por Ouro Preto que pude chegar ainda mais perto desse mistério que é a afinidade, que é a amizade, que tem a arte como fio condutor, como veia que leva o sangue do coração ao cérebro e deste para aquele. Em frente à igreja de São Francisco, com as belas obras de Aleijadinho em seu interior, sou apresentado ao guia de turismo, Dim. Mas Dim, não era só Dim, Dim era também artista de rua e tira do bolso de seu casaco o instrumento musical mais singelo que se tem notícia: a gaita de boca. E toca. E toca. E toca Maria Maria de Milton Nascimento. E toca Paisagem da Janela de Beto Guedes…
Minas Gerais tem esse mistério, algo inescrutável, algo que está escondido nos contos de Guimarães Rosa, nos versos de Carlos Drummond de Andrade e que a cada dia que passa só a alguns é dado ler e descobrir.
*Paulo Atzingen é jornalista e viajou a Belo Horizonte no presstrip #vemprabh
- Fonte: Diário do Turismo, media partner do Portal Turismo Total