Por Hieros Vasconcelos Rêgo
Os casos frequentes de furtos, roubos e agressões que acontecem no Pelourinho, centro histórico de Salvador, na Bahia, resultaram em um episódio costumeiro, no último domingo (20), que evidenciou, mais uma vez, o racismo que afeta o povo soteropolitano e a ausência – que perdura há anos – de políticas públicas capazes de proporcionar ao local a devida segurança, paz e cidadania: turistas que foram roubados, descrentes da eficácia da polícia, tentaram invadir a casa de uma moradora do Pelourinho acusando-a de ter sido a praticante do crime, sem provas e sem certezas.
Nas redes sociais, a moradora, de prenome Larissa, fez um desabafo indignado afirmando que os turistas, além da tentativa de invasão, a agrediram verbalmente com ofensas e acusações. “Quebraram minha porta e minha janela, me acusando de ladra. Ele vai provar. Todos eles. Vou prestar queixa. Preconceituosos, burguesinhos, vão ter que provar que eu roubei. Chegou na porta da minha casa chutando, batendo Vou provar que sou inocente”, diz no vídeo.
Ela relata que seu filho assistia televisão e, ao ir na cozinha beber água, ouviu uma série de ofensas vinda do lado de fora de sua casa. Ao procurar saber do que se tratava, e ao se aproximar da porta, foi surpreendida pelos turistas forçando a entrada em sua residência. “Eu sou uma mãe de família, eu sou honesta. Eu não tenho trabalho fixo, mas estou sempre em trabalho honesto. Aqui é gente do bem. Ao inves de procurarem quem roubou, foram atrás de uma casa de família”, disparou.
O caso foi parar na Central de Flagrantes da Polícia Civil. A nota emitida pela instituição, diz que: “Informações preliminares dizem que um homem furtou uma corrente de uma turista e ao fugir entrou na casa de um casal que estava dormindo. As vítimas seguiram o autor, e ao entrarem na residência foram agredidos pelo casal. Os turistas compareceram a central de flagrantes, guia de lesões corporais foram expedidas, todos foram ouvidos e liberados O autor do crime foi identificado pela Polícia Civil”. A moradora disse que vai voltar à delegacia para requerer seus direitos e para buscar justiça.
Professsor, cientista social e investigador policial, Kleber Rosa avalia que o ocorrido é “algo que estamos cansados de ver: que é racializar a o crime, o homem negro e a mulher negra como potenciais criminosos. E isso está bem refletido na atitude desses turistas, pois não tinham como afirmar e provar que ela cometeu o crime”.
No entanto, o sociólogo aponta uma realidade que há muito tempo tem sido explicitada. Nas palavras dele, o caos que hoje é o Pelourinho. . “Essa situação já é produto do caos que hoje é o Pelourinho. Sucessivos assaltos, insegurança, falta de um projeto de revitalização do Pelourinho que inclua principalmente um projeto de economia local, que insira o povo que vive ali na atividade econômica que é o turismo. È mais um caso que mostra o abandono que é o Pelourinho, onde não existe nenhum programa, nem do governo nem da prefeitura, para tornar aquele espaço digno e adequado”.
Kleber Rosa destaca, ainda, a ausência de políticas sociais. “Abandono da vida social. pessoas em condições precárias, desempregadas, subempregadas. A violência termina sendo uma consequência desse abandono”, pontua. O também cientista social Pedro Itaparica, ao ser questionado sobre o episódio, é enfático: “Toda a circunstância denota um caso de racismo estrutural. Só fato de invadir a casa de alguém já configura um crime”, ressalta.
Fonte: Tribuna da Bahia – Foto: Nelson Rocha – Arquivo Portal Turismo Total.